sexta-feira, 3 de abril de 2020

A vontade do Sebastião

        Naquela manhã de primavera, Sebastião de 11 anos acordou e preparou-se para ir para a escola.
Vestiu um fato de treino um pouco engelhado, calçou umas sapatilhas já cozidas várias vezes e, depois de guardar o lanche, foi para a escola.
Enquanto caminhava, Sebastião viu vários colegas passarem nos carros com os pais mas, todos lhe faziam caretas.
Ao chegar à escola, viu os amigos David e João a jogarem ao berlinde e, enquanto se aproximava, Filipe um colega de outro ano, passou-lhe uma rasteira.
Sebastião não conseguiu equilibrar-se e caiu mesmo de joelhos numa poça de água. Apressado, levantou-se e ao ver as calças sujas de lama, foi á casa de banho onde as limpou o melhor que conseguiu.
Pouco depois tocou a campainha e Sebastião entrou na sala com as calças molhadas. O professor Rogério ao vê-lo naquele estado, fez um ar de zangado.
- Menino Sebastião! Isso são maneiras de vir para a escola? – perguntou ele.
- Peço desculpa, senhor professor. Mas, caí ali fora – respondeu ele.
- Parece impossível! É no que dá as brincadeiras – disse o professor.
- Desculpe – disse Sebastião.
- Mas, pronto! Vai para perto do aquecedor para te enxugares e não ficares doente – disse o professor.
Sebastião foi então sentar-se perto do aquecedor e a aula começou. Quando esta terminou, no momento em que ia para sair, o professor chamou-o.
- Sebastião, não deves vir molhado para a escola. Tens que vestir sempre uma roupa enxuta – disse-lhe ele.
- Eu faço sempre isso e hoje também fiz. Mas, quando cheguei e ia para ir ter com o David e com o João, caí – explicou Sebastião.
- Não sei se foi mesmo isso que aconteceu mas, de qualquer maneira tens que ser responsável e cuidadoso – disse o professor.
- Sim, senhor professor – disse Sebastião.
- Agora, vai para o intervalo – disse o professor.
Sebastião saiu da sala e rapidamente, todos os colegas se aproximaram.
- Então Sebastião! Não tiveste tempo de ir à casa de banho – disse um.
- Se calhar esqueceste-te da fralda – disse outro.
- Ou apanhaste um grande susto – gozou outro.
Os olhos de Sebastião começaram a encher-se de lágrimas e ele afastou-se.
- Lá vai o bebé – disse um.
- Deve ir fazer queixinhas – disse outro.
- Ou então, vai à procura da chupeta – disse outro.
Durante o resto das aulas, Sebastião esteve sempre calado e ansioso por regressar a casa.
Terminadas as aulas, enquanto caminhava para casa, os amigos David e João aproximaram-se.
- Sebastião! Queres brincar connosco? – perguntou o João.
- Não. Estou chateado – respondeu o Sebastião.
- Anda lá. Esquece o que aconteceu – disse o David.
- Não esqueço. Ninguém acreditou que eu caí mas, vocês viram o que aconteceu e nem sequer uma palavra disseram – disse o Sebastião.
- Pois não. Desculpa – disse o David.
- Fomos uns medricas – disse o João.
- Pois foram. Por isso, vou já para casa – disse o Sebastião.
Ao chegar a casa, Sebastião foi tomar banho e após isso a mãe Clara aproximou-se.
- Então filho!? Que aconteceu? – perguntou ela.
Sebastião contou-lhe tudo o que tinha acontecido e foi para o seu pequeno quarto.
Os anos foram passando e Sebastião era agora um médico e foi visitar a sua aldeia. Chegado lá, foi à sua casa onde encontrou a mãe, já muito debilitada.
Depois, decidiu percorrer a aldeia e quem sabe, encontrar algum dos seus colegas de infância.
Ao passar em frente a um já antigo café, Sebastião viu David e João que sentados, jogavam as cartas.
- Olá pessoal! Como estão? – perguntou Sebastião.
- Olá – responderam os amigos.
- Então! Não me estão a conhecer!? – perguntou ele.
- Não! – responderam ambos os amigos.
- Então!? Sou o Sebastião – disse ele.
- Só podes estar a brincar – disse o João.
- Não estou não. Sou mesmo o Sebastião – disse ele.
- Então, o que te aconteceu? Estás diferente – perguntou o David.
- Vou- vos contar. Quando cheguei ao 7ºano, não pude continuar a ir à escola e, tive que começar a trabalhar – contou Sebastião.
- Até ai, nós sabemos – disse João.
- Pois. Trabalhei com uns pescadores, andei nas obras e mais tarde, consegui emprego numa loja de materiais de desporto. Mas, como sempre quis aprender mais, inscrevi-me numa escola à noite e, de dia trabalhava para à noite estudar. Como sempre fui teimoso, decidi que tinha que ser alguém e então, fui estudar medicina – disse Sebastião.
- Mas, como conseguiste? – perguntou David.
- Foi difícil. Mas, agora que já cheguei onde queria, decidi voltar à minha aldeia e ajuda-la no que puder – respondeu Sebastião.
A partir desse dia, todos compreenderam que os sonhos têm muita força e que, se lutarem por eles, conseguem alcança-los.